Antidepressivos
Uma
nova droga congestiona ainda
mais o concorrido mercado mundial
de antidepressivos
Seis de cada dez pacientes vítimas de depressão abandonam
o tratamento antes do tempo. Para reverter esse quadro, a indústria
farmacêutica investe pesado no desenvolvimento de antidepressivos
que ajam cada vez mais rápido e com menos efeitos colaterais. Os
remédios disponíveis contra a doença levam, em média,
de duas a quatro semanas para começar a fazer efeito. Na semana
passada, durante o congresso da Associação Americana de
Psiquiatria, em Nova York, foram apresentados estudos com um novo antidepressivo
que promete diminuir a severidade dos sintomas da depressão já
na primeira semana de uso. A duloxetina, princípio ativo do medicamento
Cymbalta, faz parte de uma nova geração de antidepressivos
que atuam em mais de uma substância cerebral – como os remédios
mais antigos, os tricíclicos, sem, no entanto, causar os pesados
efeitos colaterais desses. A duloxetina age sobre a serotonina e a noradrenalina,
substâncias que, em conjunto, regulam o humor e as funções
cognitivas. Um comprimido do remédio por dia seria suficiente para
melhorar sintomas como ansiedade, pessimismo, sentimentos de culpa, pensamentos
suicidas e choro fácil. As pesquisas realizadas até agora
com a duloxetina foram encomendadas pelos próprios fabricantes
do remédio, os laboratórios Eli Lilly e Boehringer Ingelheim.
Segundo esses trabalhos, a taxa de eliminação total dos
sintomas é superior a 40% entre os pacientes tratados com duloxetina.
Com outros antidepressivos, esse índice é de 30% dos casos.
Mais de 3 000 pessoas já participaram de estudos com o Cymbalta.
Do ponto
de vista químico, o desequilíbrio nos níveis de serotonina
e noradrenalina está na origem dos quadros depressivos. Encontrar
uma fórmula que atue especificamente nessas duas substâncias
e seja bem tolerada é hoje questão de ordem na indústria
farmacêutica. Houve avanços tremendos nas cinco décadas
que se seguiram desde o descobrimento do primeiro remédio para
tratar depressão. A primeira classe de antidepressivos, os tricíclicos,
ao agir na produção de serotonina e de noradrenalina, acaba
por interferir em outras substâncias. Por isso, medicamentos como
Anafranil e Tofranil, entre outros, causam ganho de peso, boca seca, constipação,
tontura e visão embaçada, além de problemas sexuais.
Mesmo assim, muitos médicos ainda consideram os tricíclicos
o tratamento de primeira linha para depressão, especialmente nos
casos mais graves. Isso porque cada paciente responde de forma diferente
ao mesmo remédio. Há também os antidepressivos inibidores
da MAO, a enzima monoaminoxidase. Apesar de potentes, esses remédios
podem causar um tipo letal de hipertensão caso haja interação
com determinados tipos de substâncias. Uma reviravolta ocorreu no
fim da década de 80, com o lançamento do Prozac, que prometia
eliminar todos esses efeitos adversos. Pertencente à classe dos
medicamentos com a ação específica sobre os níveis
de serotonina, foi logo batizado de "pílula da felicidade",
num lance de marketing extremamente bem-sucedido. Embora seja bem mais
tolerável pelo organismo, estudos clínicos mostraram que,
em alguns casos, principalmente os de depressão severa, sua eficácia
não atinge os mesmos níveis dos tricíclicos. A nova
geração de antidepressivos, da qual faz parte a duloxetina,
combina, enfim, a eficácia dos tricíclicos com a maior tolerância
dos remédios da família do Prozac. Isso porque, na maioria
dos casos, a interferência deles nas taxas de outras substâncias
cerebrais é mínima. A duloxetina pertence à mesma
classe de medicamentos como Efexor, Serzone e Remeron, lançados
no fim da década de 90.
Dos vinte
antidepressivos mais vendidos no Brasil, oito têm ação
sobre serotonina e noradrenalina. Desde o lançamento do primeiro,
o Remeron, em 1996, esse tipo de remédio já conquistou quase
35% do mercado brasileiro de medicamentos contra a depressão, que
no ano passado movimentou 150 milhões de dólares. É
a quarta classe de remédios mais vendida no país, depois
de antiinflamatórios, analgésicos e contraceptivos. O Lilly
aposta que o Cymbalta será um santo remédio financeiro –
deverá recuperar o que o laboratório deixou de ganhar com
a perda de patente do Prozac, em 2001. A "pílula da felicidade"
virou um blockbuster, aquela categoria de remédios "arrasa-quarteirão",
cujas vendas somam bilhões de dólares por ano.
Os estudos
focados nos efeitos colaterais dos antidepressivos levaram a algumas descobertas
interessantes. A mais recente delas relaciona o uso dos remédios
da família do Prozac ao comprometimento da capacidade de envolvimento
amoroso. Cerca de 70% das pessoas que tomam antidepressivos de qualquer
classe relatam problemas sexuais. Os especialistas notam, agora, que essa
diminuição da libido vem acompanhada da perda de habilidade
para iniciar ou manter um romance em pacientes que se tratam com os remédios
específicos para serotonina. Uma explicação plausível
é que, ao aumentar as taxas da substância no cérebro,
esses antidepressivos refreariam os impulsos amorosos. Isso porque já
está provado que baixos níveis de serotonina favorecem a
paixão.
Fonte: Revista
Veja, 8 de maio de 2004
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